POR SOROCABANICE
Abandonada pela filha em hospital de Carangola, interior de Minas Gerais, Maria Martins Ferreira, 58 anos, conhecida como dona Maria, há seis meses foi adotada pela técnica de enfermagem Maria Verônica Grossi, 34 anos.
A história de amor entre essas duas mulheres é linda e ao mesmo tempo sofrida. Hoje, sozinha, Verônica mantém os custos da casa, do filho de 14 anos e dos tratamentos da dona Maria, que há um mês foi diagnosticada com tumor na região torácica, entre o coração e o pulmão.
“A minha menina é linda, ela é uma benção em minha vida”, é assim que a técnica de enfermagem define a dona Maria. Muito emocionada, ela contou ao Razões como suas vidas foram entrelaçadas.
Como tudo começou
Há 11 anos, Verônica, como é conhecida, trabalhou num posto de saúde na zona rural de Carangola. Como o posto era muito longe para alguns moradores serem atendidos, diariamente a técnica de enfermagem pegava a sua moto e visitava as casas. Numa destas visitas, conheceu a dona Maria, que morava com uma filha e o genro.
“A dona Maria era sempre muito comunicativa e humorada. Ela não apresentava nenhuma doença. Eu adorava ouvir suas histórias. Ríamos muito juntas. Mas ela vivia numa situação muito precária. Passaram-se os anos e com o tempo, eu criei o meu vínculo com a dona Maria”, disse.
Nesse tempo, dona Maria saiu da zona rural e se mudou para perto da casa da Verônica e mais uma vez o acaso aproximava a vida delas. Porém, com ela mais próxima dos olhos de Verônica, a técnica de enfermagem identificou que tinha algo errado na casa da amiga e descobriu que ela sofria com agressões e até com uso de drogas por parte da filha e do genro.
“Cheguei a chamar o conselho tutelar, assistente social, só que nada resolvia. Eu via no olhar da dona Maria que estava acontecendo algo e ela não me contava. Ela também sempre foi muito apegada a filha”.
Porém, há oito meses, aconteceu um episódio muito triste que aproximou ainda mais a Verônica de dona Maria.
“Minha mãe disse que fazia uns cinco dias que ela não via sair fumaça no fogão de lenha da casa da dona Maria. Fiquei preocupada, então, fui lá ver o que estava acontecendo.”
Quando a Verônica chegou na casa, ela encontrou a residência toda aberta. Então, ela entrou chamando e procurando por dona Maria. E nada. A casa um silêncio e toda revirada. Quando, de repente, ela encontrou a dona Maria desmaiada e caída na beirada da cama.
“No momento o susto foi tão grande, que eu achei que ela estava morta. Corri para casa e peguei o carro emprestado do meu pai. Colocamos a dona Maria no carro e a levamos para o hospital. Isso era num domingo. Ela foi levada diretamente para a emergência. Estava muito desidratada e teve que ficar alguns dias internada.”
E no meio desse acontecimento todo, Verônica não sabia do paradeiro da filha e do genro. Ela foi atrás deles para contar como dona Maria estava e também para procurar explicações e exigir que acompanhassem a idosa na internação.
“Ela disse que não iria ao hospital ficar com a mãe, pois tinha outros compromissos. Nesse intervalo, eu fui ficando com a dona a Maria. Eu trabalhava um dia sim e no outro ficava com ela no hospital. Passaram-se dez dias e a doutora, que estava cuidando do caso dela, me mandou uma mensagem informando que detectaram numa tomografia um tumor na região torácica, entre o coração e o pulmão. Foi quando eu percebi que a situação era mais grave do que eu imaginava.”
Verônica tentou novamente entrar em contato com a filha da dona Maria para contar sobre o estado de saúde da mãe. E novamente a resposta que ela recebeu foi um não.
“Ela disse que não cuidaria de uma pessoa tomada pelo câncer. E pediu que eu parasse de procurá-la e de mandar recado.”
Foi então que a técnica de enfermagem decidiu conversar seriamente com a dona Maria, que já estava preocupada com a filha e perguntava por ela.
“Eu falei, ‘dona Maria, eu não vou mentir, mas a sua filha não vai vir visitá-la. Mas não precisa ficar triste, porque eu vou cuidando da senhora até resolvemos isso’”.
O dia que decidiu adotar a dona Maria
Passaram-se dois meses dela internada, e a filha realmente não foi visitá-la. Verônica contou que chegou em casa e começou a pensar na situação da idosa que não tinha ninguém e nenhum benefício para que pudesse ir a algum asilo. A técnica de enfermagem sustenta a casa sozinha e tem um filho de 14 anos.
“Chamei o meu filho e contei que decidi fazer uma coisa, mas que precisaria do apoio ele. Expliquei que adotaria a dona Maria, mas que ele teria que me ajudar, pois nos privaríamos de várias coisas para cuidar dela, e que muitas vezes, não conseguiria comprar o que ele queria e que ele precisaria entender e não me cobrar isso. Foi então que ele super topou.”
Verônica voltou ao hospital e deu a notícia à idosa que ficou muito feliz.
“Ela ficou muito emocionada e disse que não acreditava que eu tiraria ela daquela vida.Eu fui até a assistente social do hospital e relatei os fatos. Ela já estava acompanhando o caso da dona Maria. Ela fez uma documentação e a filha assinou afirmando que não queria cuidar da mãe e que todas as responsabilidades agora seriam minhas.”
Hoje, elas completam seis meses juntas de muito amor e carinho.
“Parecia que eu tinha acabado de voltar da maternidade. Arrumei o quarto pra ela e a minha casa se transformou para receber a dona Maria”, disse emocionada.